terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Cinética de consumo de oxigênio. Parte 1


Desde 1923 quando Archibald Vivian Hill e Hartley Lupton ganharam o prêmio Nobel, o consumo de oxigênio (VO2) passou a ter presença frequente nas pesquisas sobre as respostas fisiológicas durante o exercício. Cerca de 100 anos atrás, Krogh e Lindhard (1913) mensuraram graficamente o consumo de O2 em um intervalo de tempo específico após o início de exercício de intensidade moderada. Eles encontraram que o VO2 alcançava um estado estável em seus valores com 1 – 2 minutos de exercício leve, com 3 minutos para o exercício moderado, mas não encontrava o estado de equilíbrio com um exercício muito pesado. Por cerca de 40 anos os estudos pioneiros de Krogh e Lindhard foram seguidos com um foco principal na resposta do VO2 depois do exercício.
Mais recentemente, estudos realizados por Gaesser e Poole (1996) propuseram três domínios de intensidade de esforço. O domínio moderado compreende todas as intensidades de esforço que podem ser realizadas sem alteração do lactato sanguíneo em relação aos valores de repouso ou abaixo do LAer e/ou primeiro limiar de transição fisiológica (LTF1). O domínio pesado tem como limite inferior a menor intensidade de esforço que pode ser realizada no LTF1 e tem como limite superior a intensidade correspondente à máxima fase estável de lactato (MLSS) e/ou OBLA, que representam o segundo limiar de transição fisiológica (LTF2). O domínio severo inicia após a intensidade referente ao LTF2, com esta se elevando durante todo o tempo de esforço, até que o indivíduo atinja exaustão. Porém Hill, Poole e Smith (2002) propuseram que o limite superior do domínio severo é a intensidade de exercício acima da qual a duração do esforço é tão curta, que o VO2max não é atingido. Em indivíduos ativos, esta intensidade correspondeu a 136% da potência máxima atingida durante um teste incremental na bicicleta ergométrica.
Nos diferentes domínios de intensidade de exercício a cinética do Vo2 comporta-se de maneira diferente. Durante o exercício com uma taxa de trabalho abaixo do LTF1 o VO2 aumenta exponencialmente encontrando um estado estável com aproximadamente 2 minutos. Para o exercício com intensidades acima do LTF1 a cinética de VO2 torna-se mais complexa. Surge um componente (componente lento) adicional que se desenvolve lentamente e atrasa a obtenção do estado estável (15 a 20 min) que, quando encontrado apresenta um valor maior do que aquele que é predito na relação VO2 versus carga abaixo do LTF1. No domínio severo (acima do LTF2) o VO2 eleva-se mono ou bi – exponencialmente dependendo da intensidade de exercício acima ou abaixo do VO2max, respectivamente, até que este seja encontrado (GAESSER; POOLE, 1996; XU; RHODES, 1999; CAPUTO; DENADAI, 2008).
A cinética de VO2 apresenta três fases dependentes do domínio de intensidade analisado. A fase cardiodinâmica (fase 1) representa os primeiros 15 – 25 s do exercício e parece estar relacionada ao aumento do debito cardíaco e do fluxo sanguíneo nos pulmões (WHIPP; ÖZYENER, 1998). A fase 2 parece refletir as mudanças no metabolismo oxidativo muscular com um continuo aumento do retorno venoso e maior extração periférica de O2. O tempo de duração desta fase é dependente do domínio em que o exercício é realizado. No domínio moderado (abaixo do LTF1) e em indivíduos normais o estado estável ocorre em 80 – 110 s. Para o domínio pesado ou severo (abaixo do VO2max) o componente lento atrasa o alcance deste estado de equilíbrio em torno de 15 a 20 min de exercício. Finalmente a fase 3, representa o estado estável do VO2 para intensidades em que ele é atingido,  que no domínio moderado pode apresentar um comportamento linear aproximado de 9 - 11 ml.W-1.min-1 (WHIPP; ÖZYENER, 1998; XU; RHODES, 1999; DENADAI; CAPUTO, 2003).
Nos últimos anos alguns estudiosos procuram analisar a cinética de VO2 em esportes acíclicos e intermitentes e principalmente com futebol podemos encontrar na literatura algumas pesquisas desde o estudo de Dupont et al. (2005) até o mais recente de Christensen et al. (2011). Porém não é de nosso conhecimento pesquisas que investigaram fatores associados a esta temática com jogadores de futsal.

CONTINUA NOS PRÓXIMOS CAPÍTULOS...ABRAÇOS.

Referências Bibliográficas

CAPUTO, F.; DENADAI, B. S. The highest intensity and the shortest duration permitting attainment of maximal oxygen uptake during cycling: effects of different methods and aerobic fitness level. European Journal Applied Physiology, v. 103, n. 1, p. 47-57, 2008.
CARTER, H.; JONES, A.M.; BARSTOW, T.J.; BURNLEY, M.; WILLIANS, C.A.; DOUST, J.H. Oxygen uptake kinetics in treadmill running an cycle ergometry: a comparison. Journal of Applied Physiology, v. 89, n. 3, p. 899-907, 2000.
CHRISTENSEN, P. M.; KRUSTRUP, P.; GUNNARSSON, T. P.; KIILERICH, K.; NYBO, L.; BANGSBO, J.VO2 kinetics and performance in soccer players after intense training and inactivity. Medicine Science Sports Exercise, v. 43, n. 9, p. 1716-24, 2011.
DENADAI, B. S.; CAPUTO, F. Efeitos do treinamento sobre a cinética de consumo de oxigênio durante o exercício realizado nos diferentes domínios de intensidade esforço. Motriz, v. 9, n. 1, (Supl.), p. S1 – S7, 2003.
DI PRAMPERO, P.E.; MAHLER, P.B.; GIEZENDANNER, D.;  CERRETELLI, P. Effects of priming exercise on VO2 kinetics and O2 deficit at the onset of stepping and cycling.  Journal of Applied Physiology, v. 66, n. 5, p. 2023-2031, 1989.
DUPONT, G.; MILLET, G. P.; GUINHOUYA, C.; BERTHOIN, S. Relationship between oxygen uptake kinetics and performance in repeated running sprints. European Journal Applied Physiology, v. 95, n. 1, p. 27–34, 2005.
DUPONT, G.; MCCALL, A.; PRIEUR, F.; MILLET, G. P.; BERTHOIN, S. Faster oxygen uptake kinetics during recovery is related to better repeated sprinting ability. European Journal Applied Physiology, v. 110, n. 3, p. 627–634, 2010.
GAESSER, G. A.; POOLE, D. C. The slow component of oxygen uptake kinetics in humans. Exercise and Sports Science Reviews, v.24, p.35-71, 1996.
HILL, D. W.; POOLE, D. C.; SMITH, J. C. The relationship between power and the time to achieve VO2max. Medicine Science and Sports Exercise, v. 34, n. 4, p. 709 –714, 2002.
IDSTRÖM, J. P.; SUBRAMANIAN, V. H.; CHANCE, B.; SCHERSTEN, T.; BYLUND-FELLENIUS, A. C. Oxygen dependence of energy metabolism in contracting and recovering rat skeletal muscle. American Journal of Physiology, v. 248, n. 17 (Heart Circulation Physiology), p. H40-H48, 1985.
KROGH, A., LINDHARD, J. The regulation of respiration and circulation during the initial stages of muscular work. Journal Physiology, v. 47, n. 1, p. 112–136. 1913.
MARWOOD, S.; ROCHE, D.; ROWLAND, T.; GARRARD, M.; UNNITHAN, V. B. Faster pulmonary oxygen uptake kinetics in trained versus untrained male adolescents. Medicine Science and Sports Exercise, v. 42, n. 1,p.127–134, 2010.
MARWOOD, S.; ROCHE, D.; GARRARD, M.; UNNITHAN, V. B. Pulmonary oxygen uptake and muscle deoxygenation kinetics during recovery in trained and untrained male adolescents. European Journal of Applied Physiology, v. 111, n. 11, p. 2775-84, 2011.
ÖZYENER, F.; ROSSITER, H. B.; WARD, S. A.; WHIPP, B. J. Influence of exercise intensity on the on- and off-transient kinetics of pulmonary oxygen uptake in humans.  Journal of Physiology, v. 533, n. 3, p. 891-902, 2001.
RAMPININI, E.; SASSI, R.; MORELLI, A.; MAZZONI, S.; FANCHINI, M.; COUTTS, A. J. Repeated-sprint ability in professional and amateur soccer players. Applied Physiology Nutrition Metabolism, v.34, n.6, p.1048-54, 2009.
ROSSITER, H. B; WARD, S. A.; KOWALCHUCK, J. M.; HOWE, F. A.; GRIFFITHS, J. R.; WHIPP, B. J. Dynamic asymmetry of phosphocreatine concentration and O2 uptake between the on- and off-transients of moderate- and high-intensity exercise in humans.  Journal of Physiology, v.15, n. 541.3, p. 991-1002, 2002.
WHIPP, B. J.; ÖZYENER, F. The kinetics of exertional oxygen uptake: assumptions and inferences. Medicina Dello Sport, v. 51, p. 139-149, 1998.
XU, F.; RHODES, E. C. Oxygen uptake kinetics during exercise. Sports Medicine, v. 27, n. 5, p. 313-327, 1999.

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

ÍNDICES NEUROMUSCULARES E CAPACIDADE SPRINTS REPETIDOS EM JOGADORES JOVENS DE FUTSAL


Paulo Cesar do Nascimento, Francimara Budal Arins, Luiz Guilherme Antonacci Guglielmo. Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC, Florianópolis, SC, Brasil. Email: nascimentopc84@hotmail.com


Introdução: A habilidade de realizar sprints repetidos (RSA) é um fator decisivo da performance no futsal, visto que cada série executada determina respostas metabólicas semelhantes ao que ocorre nas partidas (p.e., redução dos níveis de pH muscular, fosfocreatina e ATP, ativação da glicólise anaeróbia). Objetivo: Verificar se as variáveis neuromusculares possuem relação com os índices fisiológicos obtidos no teste de sprints repetidos em jogadores de futsal. Metodologia: 14 atletas da categoria sub17 (16,7 ± 0,5 anos; 68,5 ± 6,6 kg; 176,6 ± 4,5 cm e 10,1 ± 4,0% de gordura) foram submetidos ao teste de potência muscular de membros inferiores com 3 saltos verticais Counter movement jump (CMJ) e uma série de Continous jump (CJ) durante 15 s utilizando a plataforma de força (QUATTRO JUMP) tipo piezelétrica. Aplicou-se o teste anaeróbio (BAKER et al. 1993; ver figura) de 8 sprints de 40 m com duas mudanças de sentido de 1800 e período de recuperação de 20 s entre cada sprint, utilizando um par de fotocélulas eletrônicas (Speed Test 4.0) para determinar o melhor tempo (MT), tempo total (TT) e o pior tempo (PT). O índice de fadiga (IF) foi calculado a partir da fórmula IF= [Σ8TEMPOS/(MT x 8) x 100] – 100. Foi empregada a análise descritiva (média e SD) e para determinar à relação das variáveis a correlação linear de Pearson, nível de significância p≤ 0,05. Resultados: Foram observadas correlações de moderadas a altas entre as variáveis, com exceção para o IF (ver tabela).





Conclusão: De acordo com os resultados obtidos o CMJ e o CJ, indicadores de potência muscular com o aproveitamento da energia elástica do ciclo alongamento encurtamento e dos processos neuromusculares e metabólicos, respectivamente, estão relacionados à habilidade de realizar sprints repetidos, frequentemente exigida durante os jogos da modalidade.

Um abraço e até a próxima! 


segunda-feira, 3 de setembro de 2012

AVALIAÇÃO ANAERÓBIA E NEUROMUSCULAR NO FUTSAL: UMA REVISÃO DE LITERATURA

Resolvi postar outro artigo na integra sobre aspectos que envolvem a avaliação e prescrição do treinamento no futsal. Esse artigo também foi publicado nos anais do 11º Fórum Internacional dos Esportes - 2012. Abraços e até a próxima!

RESUMO
O futsal é uma modalidade coletiva intermitente, caracterizado por possuir elevada solicitação do sistema anaeróbio durante as partidas, visto que a maior parte do tempo (80%) os jogadores realizam atividades consideradas vigorosas, as quais exigem intensidades de esforço superiores a 85% da frequência cardíaca máxima. Observando o perfil de atividade e as demandas fisiológicas de jogadores de futsal profissional durante partidas, constata-se que 22,6 % da distância total percorrida pelos atletas acontecem em esforços de alta intensidade (corridas de 18 a 25 km.h-1 e sprints máximos), evidenciando uma alta participação do metabolismo anaeróbio. Portanto, torna-se evidente a necessidade da avaliação desse sistema de fornecimento de energia e dos fatores neuromusculares envolvidos para prescrição do treinamento. Dessa forma, o objetivo deste trabalho foi realizar uma revisão de literatura buscando identificar as perspectivas referentes a avaliação da performance anaeróbia e dos aspectos neuromusculares de jogadores de futsal.
Palavras-chave: Futsal, performance anaeróbia, aspectos neuromusculares.

INTRODUÇÃO

O futsal está crescendo em popularidade por todo o mundo desde o final da década de 80 sendo praticado em mais de 100 países nos cinco continentes (AMARAL; GARGANTA, 2003; BARBERO ÁLVAREZ et al., 2008; CASTAGNA et al., 2009). Porém, constata-se que existem poucos estudos disponíveis na literatura científica sobre os índices fisiológicos determinantes da performance na modalidade (LIMA; SILVA; SOUZA, 2005).
De acordo com Medina et al. (2002), para a execução de esforços de máxima intensidade e curta duração (sprints, um contra um, saídas de pressão) a energia é proveniente, principalmente, do sistema ATP-PC. Por sua vez, nas sequências de ações de transições ataque-defesa e contra-ataques sucessivos, o metabolismo anaeróbio lático é o principal responsável pela manutenção do esforço. Por fim, durante o transcorrer de toda a partida a via aeróbia possui uma participação significativa por volta de 90% dos esforços (MEDINA et al., 2002; BARBERO ÁLVAREZ; BARBERO ÁLVAREZ, 2003; BARBERO ÁLVAREZ et al., 2008).
A fadiga, que é a incapacidade de manutenção da produção de potência ou força durante contrações musculares repetidas (GIBSON; EDWARDS, 1985), pode interferir de maneira expressiva no nível de performance dos atletas durante as partidas de futsal (EVANS; LAMBERT, 2007). Como consequência das elevadas demandas do sistema ATP-PC e a ausência de uma recuperação completa para permitir restaurar as reservas de energia, a capacidade anaeróbia lática e alática torna-se um fator decisivo na execução de esforços máximos e intermitentes.
Para os atletas de futsal a performance em exercícios de elevada intensidade parece também ser dependente do nível de potência muscular (GOROSTIAGA et al., 2009), a qual pode ser definida como a capacidade do sistema neuromuscular de produzir potência durante o exercício máximo quando a produção de energia é alta e, assim, a capacidade de contração muscular pode ser limitada (PAAVOLAINEN; NUMMELA; RUSKO, 1999).
Considerando que o futsal é um desporto com constantes sprints em contra-ataques, saltos para cabeceios e movimentações rápidas para se livrar ou realizar marcação (FOSS; KETEYIAN, 2002), os atletas executam esforços com um nível de exigência muscular elevado, solicitando a mobilização máxima das capacidades específicas da modalidade como aceleração, velocidade, agilidade e sprint. Entretanto, são poucos os estudos que abordarão sobre os aspectos fisiológicos do futsal, sendo que há uma lacuna na literatura sobre as tendências de avaliação e mensuração dos componentes anaeróbios e neuromusculares em atletas desse esporte.

Procedimentos metodológicos
Deste modo, este trabalho teve como objetivo realizar uma revisão de literatura questionadora abordando quais as perspectivas contemporâneas sobre a avaliação anaeróbia e dos aspectos neuromusculares de jogadores de futsal. Contribuindo dessa forma, para pesquisadores, técnicos, fisiologistas e preparadores físicos que trabalham com a modalidade. Assim, os próximos tópicos apresentarão exemplos de índices fisiológicos avaliados em testes de laboratório e de campo para avaliar diferentes componentes anaeróbios e neuromusculares de atletas de futsal. As referências foram retiradas das bases de dados da Scielo, Pubmed e Capes, assim como de livros, teses e dissertações que abordaram a temática.


FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Avaliação da performance anaeróbia
Portanto Baker, Rasbotton e Hazeldine (1993) propuseram um teste (40 m MST) de campo para mensurar a capacidade anaeróbia com um maior volume de sprints (8 sprints de 40 m com mudanças de sentido) e um menor tempo de recuperação passiva entre os estímulos (20 s), no qual verificou que houve correlações entre IF e o melhor tempo (MT) com a potência média e a potência pico obtidos nos testes de cicloergômetro (teste de Wingate) e sprint na esteira, avaliando indivíduos fisicamente ativos.
O aprimoramento dos programas de preparação física e a intensidade atual de jogo fazem com que, cada vez mais ocorram sequências de esforços com intensidades máximas, sendo que a tolerância a fadiga torna-se determinante na performance (MEDINA et al., 2002). Ferreira et al. (2009), avaliaram 23 jogadores profissionais de futsal através do teste anaeróbio de Wingate, e afirmaram que a degradação do ATP na maioria dos casos é mais acentuada do que a sua ressíntese o que pode levar o atleta a uma maior fadiga periférica.
          Nos esportes coletivos com características intermitentes, em especial o futsal, onde há o requerimento de inúmeros sprints em curtos períodos, com uma alta intensidade, têm sido utilizados testes específicos com multi-sprints (BANGSBO,1994; BARBERO ÁLVAREZ; BARBERO ÁLVAREZ, 2003; LAKOMY; HAYDON, 2004) capazes de identificar o melhor tempo - MT (capacidade anaeróbia alática) e o tempo médio - TM ou tempo total TT (capacidade anaeróbia lática) juntamente com o índice de fadiga (capacidade de recuperação). Esses testes de campo têm demonstrado uma boa reprodutibilidade e alta validade para mensurar a capacidade de sprints repetidos (WRAGG; MAXWELL; DOUST, 2000; GLAISTER et al., 2009) sendo uma opção válida de avaliação da performance anaeróbia.
Bangsbo (1994) propôs um teste de campo baseado na repetição de esforços de alta intensidade, composto de sete sprints de 34,2 m com duas mudanças de sentido e 25 s de recuperação ativa entre os estímulos com a finalidade de avaliar a capacidade anaeróbia. Entretanto Barbero Álvarez e Barbero Álvarez (2003), ao comparar a potência aeróbia máxima (VO2max) obtida no teste vai-e-vem de 20 m e o índice de fadiga (IF) do teste de Bangsbo realizado com jogadores de futsal, verificaram que não houve correlação significativa entre as variáveis. Esses autores afirmaram que um dos motivos para falta de correlação poderia ser devido ao baixo volume de sprint e o tempo de recuperação no teste, sugerindo que um indivíduo conseguiria completar o teste utilizando predominantemente a via anaeróbia alática ATP-PC.  Dessa forma a ressíntese do ATP durante a recuperação poderia demonstrar baixos valores de IF.


Figura 2: Ilustração do percurso no teste anaeróbio 40-m MST.

Ainda, Glaister et al. (2009) realizaram um estudo com 16 indivíduos fisicamente ativos para analisar a reprodutibilidade do 40 m MST e verificaram bons valores de coeficiente de variação (CV) e coeficiente de correlação intraclasse (ICC) para o MT e TM (CV = 1.1 – 1.3%; ICC = 0.91 - 0.92).  Entretanto, parece não existir na literatura estudos que tenham aplicado este teste com modalidades intermitentes como o futsal.
Devido as características do futsal, a degradação do ATP na maioria dos casos é mais acentuada do que a sua ressíntese, o que pode levar o atleta a uma fadiga acentuada, dessa forma, a mensuração do MT também torna-se importante para esclarecer as exigências impostas ao atleta (FERREIRA et al., 2009). Barbero Álvarez e Barbero Álvarez (2003) encontraram correlações negativas significantes entre VO2max e o TM, TT e o pior tempo (PT) para realizar o teste de Bangsbo, mas não encontraram relação com o MT, assim estes autores indicam uma possível contribuição do sistema aeróbio na realização do teste.
Ainda são escassos os trabalhos sobre os índices anaeróbios no futsal e a comparação destes índices em testes de campo com modelos padrão-ouro. Entretanto, a utilização do IF e do TM para avaliação da capacidade anaeróbia em atletas de futsal parece ser uma maneira viável para auxiliar os profissionais da área na prescrição do treinamento, desde que esses valores sejam aplicados da maneira mais específica possível ao futsal (BARBERO ÁLVAREZ; BARBERO ÁLVAREZ, 2003; FERREIRA et al., 2009).
Altos valores das concentrações de lactato sanguíneo [La] verificado após um esforço máximo indicam elevada taxa de participação da glicólise anaeróbia, o que pode estar associado à capacidade anaeróbia do indivíduo, visto que mais energia (ATP) foi liberada para a contração muscular por essa via metabólica (DAL PUPO, 2009). Dessa forma o pico de lactato obtido pós-exercícios de alta intensidade tem sido utilizado como indicativo da capacidade glicolítica (JACOBS, 1986; DAL PUPO, 2009).
Baker, Rasbotton e Hazeldine (1993) ao aplicarem o teste anaeróbio 40-m MST encontraram uma forte correlação (r = 0,92) com as [La] no sprint de 30 s na esteira e o teste de Wingate (30 s) no cicloergômetro, demonstrando que a metodologia proposta é útil para avaliação do pico de lactato. Glaister et al. (2009) analisaram a reprodutibilidade desse teste e verificaram bons valores de CV (10.1 – 23.9%)  e ICC (0.74 - 0.82) para o valor de pico do lactato.
Antunes Neto, Baroni e Freitas (2006) analisaram as solicitações metabólicas de uma partida de futsal recreacional por meio dos níveis de concentrações de lactato e glicose e verificaram um aumento significativo das [La] durante a partida, sendo que, a glicose permaneceu nas mesmas condições do repouso, demonstrando que os atletas não estavam depletados no inicio da atividade, indicando que o aumento nas [La] refletiram uma condição individual de fadiga.
Entretanto, alguns estudos (JACOBS, 1986; GASTIN, 2001) questionam o uso da [La] como preditor da capacidade anaeróbia. Estes autores afirmam que as [La] no sangue indicam a solicitação da glicólise, mas não permitem nenhuma indicação sobre a utilização do sistema de fosfagênios, ficando exclusivamente como preditor da capacidade anaeróbia lática. Além disso, a variabilidade na taxa de remoção, na qual a concentração encontra picos em tempos variados após o exercício e o fato dela não refletir a produção muscular de lactato pode comprometer a análise. Ainda, as mudanças metabólicas no músculo (aumento do lactato/redução do pH) que poderiam levar a uma redução no comando do sistema nervoso central em direção ao recrutamento das unidades motoras interferem numa melhor conclusão (ROSS; LEVERITT; RIEK, 2001; ANTUNES NETO; BARONI; FREITAS, 2006).
          A ausência de estudos analisando as respostas da [La] no futsal em testes específicos dificulta uma conclusão sobre este tema, entretanto, apesar de haver discordâncias, esse índice parece ser indicado para avaliação da capacidade glicolítica dos atletas dessa modalidade, visto que o pico de lactato obtido pós-exercícios de alta intensidade tem sido utilizado como indicativo desta capacidade (DAL PUPO, 2009).  Além disso, segundo Dal Pupo (2009) uma revisão de diversos estudos apresentado por Jacobs (1986) evidenciam o fato que as respostas do lactato em exercícios supramáximos são indicadores sensíveis da adaptação ao treinamento de velocidade, e está correlacionado com a performance em exercícios severos de alta intensidade.


Avaliação dos fatores neuromusculares



No futsal a execução dos gestos motores e o padrão de movimentação exigido durantes os treinamentos e jogos geram muitas mudanças de sentido, o que acarreta na exigência de elevados níveis de potência muscular dos membros inferiores destes atletas (BARBERO ÁLVAREZ et al., 2008; CASTAGNA et al., 2009). Além disso, Ferreira et al. (2009) afirmam que esta qualidade física é um dos atributos considerados indispensáveis para o futsal.
A potência muscular é caracterizada como a taxa de realização de trabalho em determinado período, mais especificamente o produto da força pela velocidade, sendo a força provinda do torque máximo que um músculo ou grupo muscular podem gerar em determinada velocidade (DAL PUPO, 2009). O mesmo autor afirma que fatores de natureza estrutural, mecânica e funcional que implicarão diretamente na potência, determinam a força e a velocidade das contrações musculares. Entre estes fatores podem ser citados a intensidade dos impulsos neurais, a sincronização e recrutamento das unidades motoras, o tipo de fibras musculares e as propriedades elásticas do conjunto músculo-tendíneo.
A potência muscular é um fenômeno complexo de difícil mensuração in vivo, e dessa forma é normalmente estimada indiretamente por meio de saltos verticais, tais como, Counter Movement Jump (CMJ) e Continuous Jump (CJ), os quais são válidos e de grande confiabilidade (MARKOVIC et al., 2004).
A = posição inicial. B = ângulo do joelho próximo a 90º. C = joelho em completa extensão no salto.   D = aterrissagem.
Figura 1: Ilustração da realização do CMJ (BOSCO, 1999).


O CMJ investiga os níveis de força explosiva exercida, a capacidade de recrutamento neural e a reutilização da energia elástica (BOSCO, 1999). Neste salto ocorre participação do ciclo alongamento-encurtamento (CAE), potencializando a ação muscular por meio da energia elástica acumulada e aos reflexos de estiramento.
O uso do salto CJ possibilita os técnicos e profissionais da área a diagnosticar os processos neuromusculares e metabólicos em esforços de alta intensidade e curta duração. O teste CJ é importante para avaliação de atletas que participam de esportes onde a potência muscular é um fator determinante para a performance, sendo que, os mecanismos de força produzidos no CJ são muito sensíveis as características de sujeitos e as mudanças no treinamento (BOSCO, 1999).
Gorostiaga et al. (2005), após a aplicação de 11 semanas de treinamento de força explosiva (baseado no CMJ) com grupo de jogadores jovens de futebol, encontraram correlações significantes  entre as mudanças na produção de força concêntrica mensurada no teste isocinético e as velocidades de sprint no final de 5 e 15 metros, sugerindo que a potência muscular pode auxiliar na performance em sprints. Ainda, Gorostiaga et al. (2009) em um estudo que objetivou comparar aspectos neuromusculares entre atletas de futebol e futsal, verificaram que houve correlação entre CMJ e a performance no sprint de 15 m e, também observaram correlações entre os valores de produção de força concêntrica durante ações de extensão da perna no half-squat e a performance nos sprints de 5 m e 15 m para as duas modalidades.
Portanto, é possível concluir que o CMJ é um indicador de potência muscular em jogadores de futsal, sendo essa qualidade física um fator importante para performance em sprints de curta duração que frequentemente são exigidos durante os jogos da modalidade. Dessa forma, Gorostiaga et al. (2005) enfatizam a importância de combinar programas de treinamento de potência muscular com o treinamento de sprint para melhorar a performance em sprints de curta distância, com a finalidade de aprimorar a performance dos atletas durante as partidas de futsal.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A avaliação da performance de atletas é imprescindível para que a comissão técnica possua parâmetros apurados para prescrição do treinamento. Considerando as características específicas do futsal e o padrão de movimentação durante as partidas, a exigência da capacidade anaeróbia (lática e alática) e dos aspectos neuromusculares é inquestionável. Portanto a mensuração dessas qualidades físicas nesta modalidade torna-se de suma importância para a construção do planejamento por parte dos profissionais envolvidos.

REFERÊNCIAS

AMARAL, R.; GARGANTA, J. A modelação do jogo em Futsal. Análise seqüencial do 1x1 no processo ofensivo. Revista Portuguesa de Ciências do Desporto, v.3, p.298–310, 2003.

ANTUNES NETO, J. M. F.; BARONI, M.; FREITAS, A. L. Caracterização Metabólica de uma Partida de Futsal: Uma Analise Crítica Através da Bioquímica e Fisiologia do Exercício. Movimento & Percepção, v. 8, n. 11, p. 249 – 267, 2006.

BARBERO ÁLVAREZ, J. C. B.; BARBERO ÁLVAREZ, V. B. Relación entre él consumo de oxígeno y la capacidad para realizar ejercicio intermitente de alta intensidad en jugadores de fútbol sala, Revista de entrenamiento, v.17, n.2, p.13-24, 2003.

BARBERO ÁLVAREZ, J. C. B.; SOTO, V. M.; BARBERO ÁLVAREZ, V. B.; GRANDA-VERA, J. Match analysis and heart rate of futsal players during competition. Journal of Sports Sciences, v.26, n. 1, p.63-73, 2008.

BAKER, J.; RASBOTTON, R.; HAZELDINE, R. Maximal shuttle running over 40m as a measure of anaerobic performance. British Journal of sports medicine, n. 27, v. 4, p. 228 – 232, 1993.

BANGSBO, J. Fitness training in football – A scientific approach. Baegsvard: H+O Storm, 1994.

BOSCO, C. Strength assessment with the Bosco’s test. Italian Society of Sport Science, Rome, 1999.

CASTAGNA C.; D’OTTAVIO S.; GRANDA-VERA, J; ALVAREZ, B. J. C. Match demands of professional Futsal: A case study. Journal of Science and Medicine in Sport, v. 12, n. 4, p. 490 – 494, 2009.

DAL PUPO, J. Índices Fisiológicos e Neuromusculares Relacionados à Performance de Velocistas em Provas de 200 e 400 M Rasos. Dissertação de mestrado – CDS/UFSC, Florianópolis, 2009.

EVANS, W.J.; LAMBERT, C. P.  Physiological basis of fatigue. American Journal of Physical  Medicine & Rehabilitation, v.86, supl. 1, p. 29–46, 2007.
FERREIRA, A. P.; GOMES, S. A.; LANDHWER, R.; FRANÇA, N. M. Potência anaeróbia e índice de fadiga de atletas de futsal da seleção brasiliense. Revista Brasileira de Futebol, v. 2, n. 1, p. 60-69, 2009.

FOSS, M. L; KETEYAN, S. J. Bases fisiológicas do exercício e do esporte. 2. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2002.

GASTIN, P. B. Energy System Interaction and Relative Contribution During Maximal Exercise. Sports Medicine, v.31, n.10, p. 725-741, 2001.

GIBSON, H.; EDWARDS, R. H. T. Muscular exercise and fatigue. Sports medicine, v.2, n. 2, p. 120-132, 1985.

GLAISTER, M.; HAUCK, H.; ABRAHAM, C. S.; MERRY, K. L.; BEAVER, D.; WOODS, B.; MCINNES, G. Familiarization, reliability, and comparability of a 40-m maximal shuttle run test. Journal Sports Science Medicine, v. 8 p. 77-82, 2009.

GOROSTIAGA, E. M.; IZQUIERDO, M; RUESTA, M.; IRIBARREN, J.; GONZALEZ-BADILLO, J. J.; IBÁÑEZ, J. Stregth training effects on physical performance and serum hormones in young soccer players. European Journal Applied Physiology, v. 91, n. 4, p. 507-518, 2005.

GOROSTIAGA, E. M.; LIODIO, I.; IBÁÑEZ, J.; GRANADOS, C.; NAVARRO, I.; RUESTA , M.; BONNABAU, H.; IZQUIERDO, M. Differences in physical fitness among indoor and outdoor elite male soccer players. European Journal Applied Physiology, v. 106, n. 4, p. 483-491, 2009. 

JACOBS, I. Blood lactate. Implications for training and sports performance. Sports Medicine, v.3, n.1, p.10-25, 1986.

LAKOMY, J.; HAYDON, D. T. The effects of enforced, rapid deceleration on performance in a multiple sprint test. Journal Strength Condition Research, v.18, n. 3, p.579–583, 2004.

MARKOVIC, G.D; DIZDAR, I.; JUKIC, M.; CARDINALE, M. Reliability and factorial validity of squat and countermovement jump tests. Journal of Strength and Conditioning Research, v.18, n.3, p.551-555, 2004.

MEDINA, J. V.; SALILLAS, L. G.; VIRÓN, P. C.; MARQUETA, P. M. Necesidades cardiovasculares y metabólicas Del fútbol sala: análisis de La competición. Apunts Educación Física y Deportes, v.67, p.45-51, 2002.

PAAVOLAINEN, L.; NUMMELA, A.; RUSKO, H. Neuromuscular characteristics
and muscle power as determinants of 5-km running performance. Medicine and Science in Sports and Exercise, v.31, n. 1, p. 124-130, 1999.

ROSS, A.; LEVERITT, M. Long-Term metabolic and skeletal muscle adaptations to Short-Sprint training: Implications for sprint training and tapering. Sports Medicine, v. 31, n. 15, p. 1063-1082, 2001.

WRAGG, C. B.; MAXWELL, N. S.; DOUST, J. H. Evaluation of the reliability and validity of a soccer-specific field test of repeated sprint ability. European Journal Applied Physiology, v.83, n. 1, p.77–83, 2000.





sexta-feira, 17 de agosto de 2012

A CAPACIDADE ANAERÓBIA ALÁTICA E LÁTICA CONTRIBUI PARA POTÊNCIA AERÓBIA MÁXIMA DE JOGADORES DE FUTSAL?

Este foi o titulo de um recente artigo que publiquei no 11° Fórum internacional de esportes, em Florianópolis - SC. Dessa maneira quero compartilhar com vocês este trabalho, já que acredito que ele poderá contribuir de alguma maneira para os profissionais envolvidos com a modalidade. Um grande abraço e até a próxima.


RESUMO

O objetivo deste trabalho foi investigar a contribuição de índices anaeróbios e da capacidade aeróbia na potência aeróbia máxima de jogadores jovens de futsal. Participaram da pesquisa 14 atletas do sexo masculino da categoria sub-17 (16,7 ± 0,5 anos; 68,5 ± 6,6 kg; 176,6 ± 4,5 cm e 10,1 ± 4,0% de gordura) os quais foram submetidos ao teste incremental de corrida intermitente (TCAR) para determinação da capacidade aeróbia (vPDFC) e potência aeróbia máxima; e ao teste de sprints repetidos (40-m MST) para determinação das variáveis anaeróbias aláticas (melhor tempo – MT) e láticas (tempo total - TT, índice de fadiga - IF, lactato máximo - LACmax). Para verificar a relação entre os índices anaeróbios e o pico de velocidade (PV) foi utilizada a correlação linear de Pearson, e a regressão múltipla stepwise para analisar a associação destes, nível de significância p< 0,05. O PV obteve correlações significativas com a VPDFC (r = 0,81), com o MT (r = -0,48), TT (r = -0,69) e IF (r = -0,60). A análise de regressão múltipla mostrou que 52% da performance do PV pode ser explicada pelos índices TT, MT. Conclui-se que a performance anaeróbia  é determinante na potência aeróbia máxima em atletas de futsal.
Palavras-chave: Futsal, Índices anaeróbios, Potência aeróbia.

INTRODUÇÃO

Apesar de sua popularidade mundial e status competitivo existem poucos estudos que analisaram os aspectos fisiológicos do futsal (BARBERO ÁLVAREZ et al., 2008; CASTAGNA et al., 2009; BARBERO ÁLVAREZ et al., 2009).
Por ser um esporte caracterizado pela combinação de ações de elevadas intensidades, intercaladas com períodos de recuperação variáveis durante o período de jogo (40 minutos cronometrados), o futsal é uma modalidade que depende tanto de variáveis relacionadas ao metabolismo aeróbio quanto anaeróbio (MEDINA et al., 2002; ÁLVAREZ et al., 2008).
De acordo com Medina et al. (2002), para a execução de esforços de máxima intensidade e curta duração (sprints, um contra um, saídas de pressão) a energia é proveniente, principalmente, do sistema ATP-PC. Por sua vez, nas sequências de ações de transições ataque-defesa e contra-ataques sucessivos, o metabolismo anaeróbio lático é o principal responsável pela manutenção do esforço. Por fim, durante o transcorrer de toda a partida a via aeróbia possui uma participação significativa por volta de 90% dos esforços (MEDINA et al., 2002; BARBERO ÁLVAREZ; BARBERO ÁLVAREZ, 2003; ÁLVAREZ et al., 2008).
Considerando que o futsal é um desporto com constantes sprints em contra-ataques, saltos para cabeceios e movimentações rápidas para se livrar ou realizar marcação os atletas executam esforços com um nível de exigência muscular elevado, solicitando a mobilização máxima das capacidades específicas da modalidade como aceleração, velocidade, agilidade e sprint (DA SILVA et al., 2012).
Ainda, exercícios na habilidade de realizar sprints repetidos (repeated-sprint ability - RSA) são caracterizados por esforços de alta intensidade com breves períodos de recuperação. Cada repetição resulta em respostas metabólicas similares ao que ocorre durante as partidas de futsal, como a redução do pH muscular, dos níveis de fosfocreatina e ATP, ativação da glicólise anaeróbia e significante envolvimento do metabolismo aeróbio (WRAGG; MAXWELL; DOUST, 2000; ROSS; LEVERITT, 2001; MEDINA et al., 2002; SPENCER; BISHOP; DAWSON, 2005; RAMPININI et al., 2007).
Assim, o conhecimento dos índices fisiológicos que melhor predizem a intensidade de trabalho exigida durante a partida pode contribuir de forma decisiva para que a comissão técnica elabore um programa de treinamento adequado, que potencialize o desempenho frente às exigências físicas do futsal.
Nesse sentido, para que os atletas consigam manter a performance durante o tempo total de permanência em quadra, torna-se necessário que os mesmos possuam valores elevados de potência aeróbia máxima (BARBERO ÁLVAREZ; BARBERO ÁLVAREZ, 2003; SOARES; TOURINHO FILHO, 2006). Neste sentido, a utilização do pico de velocidade (PV), que é a máxima velocidade alcançada em testes progressivos de laboratório ou campo, parece ser uma opção válida para mensuração da potência aeróbia (DITTRICH et al., 2011; NASCIMENTO et al., 2011).
Dessa forma, as melhoras na performance dos jogadores devem ser preferencialmente verificadas em testes de campo bem controlados, uma vez que estes têm uma maior validade ecológica e permitem avaliar um grande número de jogadores ao mesmo tempo. Desta forma, o teste de Carminatti (TCAR) têm sido recentemente proposto e validado para avaliar a capacidade aeróbia através do ponto de deflexão da frequência cardíaca – (PDFC) e potência aeróbia (PV) de jogadores de futebol e futsal com um protocolo intermitente com aumento progressivo da distância percorrida (DA SILVA et al., 2011; DITTRICH et al., 2011).
Visto que o PV pode ser influenciado pela capacidade anaeróbia, potência muscular e habilidade neuromuscular de correr em velocidades elevadas (JONES; CARTER, 2000) a hipótese do presente estudo é que os índices fisiológicos anaeróbios (MT. TT) juntamente com o VPDFC poderão explicar a potência aeróbia máxima expressa pelo PV. Assim, o objetivo desta pesquisa foi analisar a contribuição dos índices anaeróbios determinados no teste de sprints repetidos (MT, TT, IF e LACMax) e da capacidade aeróbia (VPDFC) no pico de velocidade obtido no teste progressivo de corrida intermitente em jogadores jovens de futsal.

PROCEDIMENTOS MÉTODOLÓGICOS

Sujeitos
Participaram da pesquisa 14 jogadores do sexo masculino (16,7 ± 0,5 anos; 68,5 ± 6,6 kg; 176,6 ± 4,5 cm e 10,1 ± 4,0% de gordura) pertencentes à categoria sub-17 de uma equipe de futsal da cidade de Florianópolis com no mínimo quatro anos de treinamento precedentes ao estudo. Antes de iniciarem os procedimentos para a coleta de dados, os atletas do estudo foram esclarecidos sobre os objetivos e os métodos da pesquisa e na sequência assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. O projeto foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina sob o número 224/08 FR- 207004.
Os sujeitos realizaram as seguintes avaliações: 1) para a caracterização da amostra foram realizadas as avaliações antropométricas que seguiram os procedimentos definidos em Petroski (2007), 2) teste incremental de corrida intermitente (TCAR) para determinação de índices aeróbios, e 3) teste anaeróbio de sprints repetidos (40-m MST) para determinação de índices anaeróbios, precedidos de alongamento e aquecimento.
Todo o período de estudo aconteceu durante a temporada competitiva da periodização e foram incorporados na rotina diária de treinamento da equipe, aplicados no mesmo horário do dia e local para todos os indivíduos, sempre respeitando um intervalo mínimo de 24 horas, sendo que todos os sujeitos foram orientados para comparecerem alimentados e hidratados para realização das avaliações.

Protocolo de determinação dos índices aeróbios
Para determinação da capacidade aeróbia (VPDFC) e potência aeróbia (PV) os jogadores foram submetidos ao protocolo do teste incremental de corrida intermitente TCAR (DA SILVA et al., 2011; DITTRICH et al., 2011). O TCAR é um teste incremental máximo, do tipo intermitente escalonado, com multi-estágios de 90 s de duração em sistema “ida-e-volta”, constituído de 5 repetições de 12 s de corrida (distância variável), intercaladas por 6 s de caminhada (± 5 m). O ritmo é ditado por um sinal sonoro (bip), em intervalos regulares de 6 s, que determinam a velocidade de corrida a ser desenvolvida nos deslocamentos entre as linhas paralelas demarcadas no solo e também sinalizadas por cones. O teste inicia com velocidade de 9,0 km·h-1 (distância inicial de 15 m) com incrementos de 0,6 km·h-1 a cada estágio até a exaustão voluntária, mediante aumentos sucessivos de 1 m a partir da distância inicial.  A frequência cardíaca (FC) foi registrada ao final de cada estágio por meio de um frequencímetro (POLAR, modelo S610i, Kempele, Finlândia) para posterior cálculo do PDFC, por meio do método matemático Dmax (Kara et al., 1996). A capacidade aeróbia foi identificada através da velocidade referente ao PDFC (VPDFC). O PV foi determinado como a maior velocidade alcançada pelos atletas durante o teste.

Protocolo de determinação dos índices anaeróbios   
Para determinação das variáveis anaeróbias (melhor tempo – MT, tempo total – TT e índice de fadiga - IF) foi realizado o teste anaeróbio de sprints repetidos (40-m MST) (BAKER; RAMSBOTTOM; HAZELDINE, 1993). O protocolo consiste em 8 sprints de 40 m com duas mudanças de sentido de 180º cada  e período de recuperação de 20 s entre cada sprint. O atleta iniciou o teste no ponto médio entre 20 m, marcado por um par de fotocélulas eletrônicas (CEFISE, modelo Speed Test 6.0, São Paulo, Brasil). Em seguida o mesmo correu 10 m até a primeira marca, retornou e correu 20 m em sentido oposto até a segunda marca e correu 10 m até passar novamente pelas fotocélulas. O IF foi calculado por meio da equação IF = [(Σ 8TEMPOS / MT * 8) -1] * 100 (FITZSIMONS et al., 1993).
Para determinação do lactato máximo (LACmax) foram coletadas amostras de 25 µL de sangue do lóbulo da orelha com auxílio de um capilar heparinizado, após o 1º, 3º, 5º, 7º e 10º minutos de recuperação, o qual foi armazenado em microtubos de polietileno com tampa (Eppendorff), sendo posteriormente realizada a análise em um analisador bioquímico (YSI 2700, modelo Stat Select, OH, EUA). O LACmax foi considerado o valor de pico da concentração de lactato obtido durante o período de recuperação.

Tratamento estatístico

O programa Statistical Package for Social Sciences (SPSS 15.0 for Windows) foi utilizado para a análise estatística. Foi empregada a análise descritiva (média e desvio-padrão) para apresentação dos valores, seguido do teste de Shapiro-Wilk (n<50 a="a" as="as" correla="correla" dados.="dados." de="de" dos="dos" empregada="empregada" entre="entre" es="es" examinar="examinar" foi="foi" i="i" ltipla="ltipla" m="m" normalidade="normalidade" o="o" para="para" pearson="pearson" produto-momento="produto-momento" regress="regress" rela="rela" utilizada="utilizada" vari="vari" veis.="veis." verificar="verificar">stepwise
) para verificar quais índices fisiológicos determinam o PV, incluindo as variáveis anaeróbias (MT, TT e IF) e a variável aeróbia do teste TCAR (VPDFC). Nível de significância adotado foi de p< 0.05.

RESULTADOS

Na tabela 1 estão apresentados os resultados dos índices relacionados à potência (PV) e capacidade aeróbia (VPDFC) obtidos no teste TCAR; e os índices de capacidade anaeróbia alática (MT) e lática (TT, IF, LACMax) observados no teste anaeróbio de sprints repetidos. Pode-se observar que o PV obteve correlação significativa com o VPDFC (p< 0,01); com o MT (p< 0,05), o TT (p< 0,01) e o IF (p< 0,05). Entretanto, o LACMax não apresentou correlação com o PV (tabela 2). Apesar de significante a correlação do PV com IF, estes não mostraram associação segundo a análise de regressão (Tabela 3).

De acordo com os resultados obtidos pela análise de regressão múltipla, o TT foi o índice que, sozinho, explicou 36% da performance do PV. Selecionados como segundo modelo pela análise stepwise o TT mais o MT demonstraram uma contribuição de 52% para o PV. Ainda, o TT, mais o MT e a VPDFC determinam 75% da variação do PV.



FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

O objetivo desta pesquisa foi analisar a contribuição dos índices determinados no teste anaeróbio de sprints repetidos e do limiar anaeróbio (VPDFC) no pico de velocidade em jogadores jovens de futsal. Dessa forma, o principal achado desse estudo foi que os índices anaeróbios de capacidade lática e alática (TT e MT, respectivamente) juntamente com o índice de capacidade aeróbia (VPDFC) explicam 75% da performance do PV. Ainda, quando observados somente as variáveis de MT e TT a contribuição destes índices para o PV foi de 52%. Dessa forma, os resultados estão de acordo com a hipótese do presente estudo demonstrando a contribuição desses índices na potência aeróbia máxima de atletas de futsal.
O PV obtido no teste de campo TCAR já demonstrou reprodutibilidade e validade para mensurar a performance aeróbia em atletas de futebol e futsal (DA SILVA et al., 2011; DITTRICH et al., 2011). Recentemente, Da Silva et al. (2011) avaliando jogadores juniores de futebol demonstraram que o PV foi significativamente correlacionado com a velocidade do consumo máximo de oxigênio (vVO2max; r = 0.74, p < 0.01) e que coeficiente intraclasse do TCAR foi de 0,94 e o coeficiente de variação de 1.4%, confirmando assim a reprodutibilidade do mesmo.  Dittrich et al. (2011) por sua vez avaliaram 30 atletas de futebol (n = 18) e futsal (n = 12) e encontraram uma correlação significativa do PV com a vVO2max (r = 0.55, p < 0.01). Ainda, Nascimento et al. (2011) realizaram um estudo com 12 atletas de futsal da categoria sub-20 que evidencia os dados anteriores demonstrando uma correlação significativamente alta do PV do TCAR com a vVO2max (r = 0.91, p < 0.01). Portanto este índice é valido e confiável para avaliar a potência aeróbia máxima de jogadores de futsal.
Da mesma forma, a VPDFC pode ser uma maneira adequada para predizer o limiar anaeróbio e avaliar a capacidade aeróbia de atletas de modalidades coletivas de caráter intermitente (DA SILVA et al., 2011; DITTRICH et al., 2011; NASCIMENTO et al., 2011). Este índice contribui para performance aeróbia máxima de atletas jovens de futsal, explicando em torno de 25% da variação do PV e estando correlacionado com o mesmo significativamente (r = 0.80, p < 0.01), sendo que esta capacidade é imprescindível para recuperar os estoques intramusculares de energia durante os esforços de alta intensidade (MEDINA et al., 2002).
Da Silva et al. (2011) em seu estudo já citado anteriormente, demonstraram correlações significantes do PV com o MT (r = 0.51, p < 0.01) e com o tempo médio (TM; capacidade anaeróbia lática; r = 0.71, p < 0.01) obtido no teste de sprints repetidos, corroborando com os achados da presente investigação que demonstrou relações similares (MT r = -0.48; TT r = -0.69). Estes autores observaram que a vVO2max juntamente com o TM contribuiu em 73% na performance do PV.
No presente estudo não foi realizado teste incremental em laboratório o que dificulta as comparações, porém levando em conta que Da Silva et al. (2011) encontraram que vVO2max isoladamente explicou 54% do PV pode-se supor  que o TM contribui em torno de 20% no PV de jogadores de futebol do estudo citado. Assim, parece que a capacidade anaeróbia lática determina um percentual maior da performance do PV em atletas de futsal, visto que, o TT sozinho demonstrou uma contribuição de 36% para o PV. Ainda, quando adicionada a capacidade anaeróbia alática (MT) este percentual aumentou para 52% ressaltando a grande importância destas variáveis na performance de jogadores de futsal.
Isto suporta que as características intermitentes do TCAR possibilitam a avaliação dos aspectos anaeróbios, levando também em conta as relações existentes entre o PV e o melhor tempo, tempo total e o índice de fadiga, obtidos no teste anaeróbio de sprints repetidos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

De acordo com os resultados encontrados neste estudo que demonstraram a contribuição da capacidade anaeróbia lática e alática para a potência aeróbia máxima, ressalta-se que aspectos anaeróbios de jovens jogadores de futsal são de suma importância para a performance aeróbia dessa modalidade, visto que, essas qualidades físicas são imprescindíveis considerando as características do esporte.

REFERÊNCIAS

BARBERO ÁLVAREZ, J. C. B.; BARBERO ÁLVAREZ, V. B. Relación entre él consumo de oxígeno y la capacidad para realizar ejercicio intermitente de alta intensidad en jugadores de fútbol sala, Revista de entrenamiento, v.17, n.2, p.13-24, 2003.

BARBERO ÁLVAREZ, J. C. B.; SOTO, V. M.; BARBERO ÁLVAREZ, V. B.; GRANDA-VERA, J. Match analysis and heart rate of futsal players during competition. Journal of Sports Sciences, v.26, n. 1, p.63-73, 2008.

BARBERO ÁLVAREZ, J. C.; D’OTTAVIO, S.; VERA, J. G.; CASTAGNA, C. Aerobic fitness in futsal players of different competitive level. Journal of Strength Condition Research, v. 23, n. 7, p. 2163–2166, 2009.

BAKER, J.; RASBOTTON, R.; HAZELDINE, R. Maximal shuttle running over 40m as a measure of anaerobic performance. British Journal of sports medicine, n. 27, v. 4, p. 228 – 232, 1993.

CASTAGNA C.; D’OTTAVIO S.; GRANDA-VERA, J; ALVAREZ, B. J. C. Match demands of professional Futsal: A case study. Journal of Science and Medicine in Sport, v. 12, n. 4, p. 490 – 494, 2009.

DA SILVA, J. F.; DETANICO, D.; FLORIANO, L. T.; DITTRICH, N.; NASCIMENTO, P. C.; SANTOS, S. G.; GUGLIELMO, L. G. A. Níveis de potência muscular em atletas de futebol e futsal de diferentes categorias e posições. Motricidade, v. 8, n. 1, p. 14 – 22, 2012.

DA SILVA, J. F.; GUGLIELMO, L. G. A.; CARMINATTI, L. J.; DE OLIVEIRA, F. R.; DITTRICH, N.; PATON, C. D. Validity and reliability of a new field test (Carminatti's test) for soccer players compared with laboratory-based measures. Journal of Sports Sciences, v. 28, n.15, p. 1621-1628, 2011.

DE-OLIVEIRA, F. R. Predição dos limiares de lactato e ajustes de freqüência cardíaca no teste de Léger – Boucher. Tese (Doutorado em Filosofia e Ciências da Educação), San Sebastián: Universidade do País Basco, 2004.

DITTRICH, N.; DA SILVA, J. F.; CASTAGNA, C.; DE LUCAS, R. D.; GUGLIELMO, L. G. Validity of Carminatti's test to determine physiological indices of aerobic power and capacity in soccer and futsal players. Journal of Strength and Conditioning Research, v. 25, n. 11, p. 3099-3106, 2011.

FITZSIMMONS, M.; DAWSON, B.; WARD, D.; WILKINSON, A. Cycling and running Tests of repeated sprint ability. Australian Journal of Science and Medicine in Sport, v. 25, n. 4, p. 82-87, 1993.

JONES A. M., CARTER H. The effect of endurance training on parameters of anaerobic fitness. Sports Medicine, v. 29, n.6, p. 373-86, 2000

KARA, M.; GÖKBEL, H.; BEDIZ, C.; ERGENE, N.; UÇOK, K.; UYSAL, H. Determination of the heart rate deflection point by the Dmax method. Journal of Sports Medicine and Physical Fitness, v.36, n.1, p.31-34, 1996.

MEDINA, J. V.; SALILLAS, L. G.; VIRÓN, P. C.; MARQUETA, P. M. Necesidades cardiovasculares y metabólicas Del fútbol sala: análisis de La competición. Apunts Educación Física y Deportes. V.67: p.45-51, 2002.

NASCIMENTO PC, BALDI MF, ARINS FB. Relação dos índices fisiológicos encontrados no teste de campo incremental de corrida intermitente - TCAR com índices de teste laboratorial em jogadores de futsal. In 10º Fórum internacional de esportes - Esporte & Turismo. Florianópolis: 2011.

PETROSKI, E, L. (Org). Antropometria: Técnicas e Padronizações. 3ª ed. Porto Alegre: Palotti, 2007.

RAMPININI, E.; BISHOP, D.; MARCORA, S. M.; BRAVO, D. F.; SASSI, R.; IMPELLIZZERI, F. M. Validity of simple field tests as indicators of match-related physical performance in top-level professional soccer players. International Journal of Sports Medicine, v.28, n. 3, p.228–235, 2007.

ROSS, A.; LEVERITT, M. Long-Term metabolic and skeletal muscle adaptations to Short-Sprint training: Implications for sprint training and tapering. Sports Medicine, v. 31, n. 15, p. 1063-1082, 2001.

SOARES, B.; TOURINHO FILHO, H. Análise da distância e intensidade dos deslocamentos, numa partida de futsal, nas diferentes posições de jogo. Revista Brasileira de Educação Física e Esporte, v. 20, n. 2, p. 93-101, 2006.

SPENCER, M.; BISHOP, D.; DAWSON, D., et al. Physiological and Metabolic Responses of Repeated-Sprint Activities: Specific to Field-Based Team Sports. Sports Medicine, v. 35, n.12, p.1025-44, 2005.

WRAGG, C. B.; MAXWELL, N. S.; DOUST, J. H. Evaluation of the reliability and validity of a soccer-specific field test of repeated sprint ability. European Journal Applied Physiology, v.83, n. 1, p.77–83, 2000.